F. Richard Hauck, Ph.D.
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Tradutor Elson C Ferreira – Curitiba/Brasil – 2005
Muitos dos arqueólogos que eu conheço reagem quase da mesma maneira durante os momentos de descoberta. A descoberta pode ser a de encontrar vários vasos cerâmicos sob um recife ou um artefato de 12.000 de idade na escavação de uma duna.
Pode ser a identificação de uma antiga ocupação estratificada exposta pela erosão, uma vila de artesãos fabricantes de cestos, ou uma pirâmide clássica Maia escondida pela mata. Uma descoberta parece começar com um momento de silêncio seguido de uma pequena explosão de alegria e então uma intensa consciência de nosso lugar pessoal no tempo e no espaço na existência do homem. A maioria dos arqueólogos não admite isso abertamente, mas as descobertas nos elevam de um modo não muito diferente de um corredor bem sucedido no alto de sua realização.
Foi assim que aconteceu comigo em Coban, no ano 1981 com a descoberta de um enorme complexo de fortificações nas planícies centrais da Guatemala. As análises geográficas do Livro de Mórmon dos anos anteriores já haviam apontado sua localização altamente estratégica como um viável candidato para o povoado fortificado de Mânti, como tendo sido construído sob a direção do comandante nefita Moroni durante a guerra de 72 a 60 a.C.
No final do meu primeiro dia de exploração, ao descobrir que estávamos acampados bem no centro da própria fortificação que eu estava procurando, experimentei novamente aquele transbordamento de alegria que acompanha uma importante descoberta. Eu ainda experimento aquela exuberância de sentimentos sempre que penso nisso, mesmo depois de 13 anos de separação entre mim e aquele momento. A descoberta destas fortificações tem sido um dos pontos altos de minha carreira como arqueólogo profissional.
Após ter recuperando minha serenidade naquela tarde de Janeiro, meu foco no local imediatamente se voltou para sua verificação. Fome, fadiga, lama e roupa molhada se tornam impedimentos menores; meus esforços estavam dirigimos em determinar se estas antigas construções datavam de 2.000 anos de idade. Essas depressões e trincheiras realmente se encaixam com as descrições dadas no Livro de Mórmon? Eu precisava conhecer a configuração e a extensão da erosão das trincheiras que se estendiam diante de mim cobrindo acres da campina e deixavam exposta a encosta da montanha. Eu precisava saber o que os nativos Maias e os proprietários das terras pensavam a respeito dessas trincheiras. Eu precisava saber quão extenso era este complexo. Será que ele ligava as montanhas ao redor, criando um sistema de controle militar de várias milhas de diâmetro?
Igual a uma criança numa sorveteria, enfiado num imenso bolo com sorvete, eu queria de tudo, mas não sabia por onde começar.
Os dourados e inclinados raios de sol da tarde eram um lembrete de que dentro de poucas horas os campos cor de esmeralda logo ficariam escuros demais para continuar as explorações. Fui para a trincheira mais próxima e comecei a pesquisar suas paredes e o fundo, à procura de objetos que possivelmente estivessem expostos. Objetos tais como restos de pedra lascada, ferramentas de pedra, fragmentos de cerâmica, e cinzas ou carvão de material orgânico, usados pelos arqueólogos para identificar a cultura e o tempo de ocupação de antigos povoamentos.
A primeira trincheira de aproximadamente seis a oito pés de largura tinha apenas um pé de profundidade por ter ficado exposta a anos de erosão e assoreamento. O parapeito da trincheira ou pilares que normalmente estariam amontoados no topo do barranco, já há muito haviam se perdido. Talvez eles tivessem caído dentro da trincheira abandonada como parte do processo de erosão. Pode ser que pilhas de entulho tivessem sido tiradas dali durante antigas escavações em grandes cestos amarrados nas costas de centenas de homens, e levados para alguma outra parte do complexo para serem usados na construção de terraços.
Pastagens plantadas para alimentar o gado agora cobriam as laterais e o fundo das trincheiras obscurecendo assim o fundo delas. Uma ou outra cova de roedores e suas pilhas de espólios podem ser observadas ao longo da parede da trincheira. Minha atenção logo voltou para o exame daquele solo macio em busca de objetos trazidos por roedores dos níveis enterrados na trincheira. Enquanto eu analisava minuciosamente com minha pá o solo sob as covas dos roedores, pedra lascada, cinzas e fragmentos de cerâmica se revelaram.
Em uma hora eu encontrei três dúzias de pedaços, a maioria deles não identificável. Aqueles que puderam ser classificados por sua forma, preparação superficial e decoração, foram manufaturados durante o último período Pré-Clássico. Eles tinham quase dois mil anos.
Gradualmente a qualidade da luz diminuiu. Até então eu estava realmente forçando a visão para encontrar covas de roedores e seus montes, e encontrei a pele recentemente desprendida de um réptil sem pernas. Os cabelos das minhas costas e do meu pescoço arrepiaram imediatamente. Isto acontece. É uma ação de reflexo aprendida nas Filipinas, Yucatán, e Guatemala enquanto me arrastava através das silenciosas e sombreadas florestas habitadas por estas sutis criaturas.
Sabendo por experiência própria da sua destreza em deslizar ao redor no escuro procurando algo para comer, e descobrindo minha preferência por outros lugares, eu decidi parar a procura. Enquanto eu caminhava cuidadosamente pela escura ladeira em direção do conforto do bem iluminado motor home, eu considerei que agora, naquele momento desta crucial descoberta, aquele provavelmente poderia ser o momento de encontrar os olhos brilhantes de alguma serpente com raiva de gringos Mórmons.
Os índios locais repetidamente asseguraram-me de que serpentes não venenosas habitavam aquela região. Eu não acreditei neles. Depois do por do sol eles sempre ficam a salvo dentro de suas barracas ou choupanas olhando uns para os outros sobre suas velas e fogueiras. Eles não admitem, mas sabem o que está se arrastando por ali.
Na manhã seguinte eu levantei do motor home com a primeira luz do dia e, acompanhado de meu pai, comecei o processo de exploração e verificação do local. Nós despendemos longas horas durante as semanas seguintes explorando e mapeando depressões de trincheiras, e abrindo caminho através da vegetação rasteira. Longas horas foram despendidas limpando e examinando cerâmica recuperada nos cortes de estrada e em exposição natural. Meu desejo de começar imediatamente uma escavação foi temperado por meu julgamento e disciplina; escavações sem permissão governamental é vandalismo, não importando quão digna seja a causa. Sendo assim, eu restringi meu desejo natural e profissional de abrir as trincheiras. Hoje, 13 anos depois, eu ainda estou esperando condições próprias para que possa começar a escavação destas fortificações no local que chamei La Finca ou, A Fazenda.
Além da assistência que recebi de meu pai, Forrest R. Hauck (1981 e 1988) e de meu filho Greg Hauck (1981 e 1989) durante as várias épocas de exploração em La Finca e Coban, três outras pessoas têm feito contribuições substanciais nos esforços de pesquisa de campo. Seus nomes são Cordell Anderson, Vaughn Hansen, e Gary Elliott. Estes homens têm fornecido significativa ajuda na identificação dos complexos de fortificações.
O proprietário de La Finca, é um norte americano que serviu missão na América Central e depois retornou para a Guatemala para começar sua vida de trabalho entre os empobrecidos índios Maias do altiplano. Seu nome é Cordell Anderson. Sua vida entre os Pokumche Maia durante os últimos 25 anos é a igualmente dura experiência da maioria dos membros da Igreja. Ele e sua esposa Maria, juntamente com sua crescente família, viveram anos sob condições difíceis, ganhando gradualmente a confiança dos índios e sua ajuda. Eles ensinaram aos índios o Evangelho de Jesus Cristo e administraram suas necessidades resultando finalmente na salvação da vida de muitas pessoas, recém-nascidos e crianças doentes.
Nos anos que se seguiram após o descobrimento de La Finca, em 1981, aos poucos fui conhecendo este homem e entendendo o que dirigiu sua determinação em servir aos índios. A cada ano em que retornei para continuar o estudo arqueológico do lugar, eu pude aprender quanto ao seu progresso e falhas durante os meses que passei longe dali.
Freqüentemente refleti quão cuidadosamente o Senhor havia preparado a situação para mim em La Finca. Eu havia acampado no centro das fortificações que as acumuladas evidências indicavam terem sido preparadas pelo comandante nefita Morôni durante a guerra de 72-60 a.C. para defender seu povo em Mânti. Essas mesmas fortificações eram de propriedade de um membro da Igreja que podia entender completamente e apoiar meu interesse na exploração e estudo desse antigo local. Meu amigo não ficou apenas interessado em minhas pesquisas como também me supria com alimentos e um local relativamente a salvo para que eu ficasse nos anos seguintes, quando a região não era seguro para um gringo norte americano. Começando em 1982, as operações da guerrilha comunista algumas vezes aconteceram na propriedade dos Cordell.
Comboios militares eram emboscados nas estradas e soldados feridos eram carregados para sua casa. Temeroso com as atrocidades que a guerrilha comunista estava perpetrando contra os proprietários americanos e guatemaltecos, ele enviou Maria e seus filhos de volta para Utah e depois ficou escondido por vários anos. Vários proprietários que resistiram, a uma milha de distância da fazenda dos Cordell, foram brutalmente assassinados. Numa tentativa de apaziguar os terroristas nazistas, Cordell escriturou boa parte das suas terras, incluindo grandes porções das fortificações, aos índios locais.
Algumas vezes ele ou seus homens armados me preveniram de ficar além dos montes ao sul, só a duas milhas acima da fazenda, porque as guerrilhas ficavam atrás da localidade e tinham um esconderijo naqueles montes. Viajando na Guatemala durante aqueles anos difíceis, eu me confortei no conhecimento de que a qualquer hora que chegasse a La Finca, algumas vezes podia acontecer de eu apenas descer do carro alugado e poder sempre encontrar pessoas amigáveis, boa comida e um lugar seco onde pendurar minha rede de dormir.
Eu fui até os Cordell e aos índios locais e perguntei-lhes a respeito das trincheiras. Nossas explorações estavam começando a mostrar que as fortificações de La Finca cobriam várias milhas quadradas. Certamente eles poderiam me dizer o que pensavam a respeito das trincheiras; talvez tivessem algum conhecimento folclórico a respeito desse fenômeno. Eles disseram que sim, que sabiam a respeito das depressões e pensavam que elas tivessem sido cavadas para conter o gado leiteiro. Outros pensavam que as trincheiras haviam sido feitas para definir limites de propriedades.
Os registros locais mostravam que a localidade das fortificações havia sido utilizada nos quase 150 anos anteriores, para exploração de cana de açúcar. Os montes usados para o cultivo de cana ainda eram visíveis na superfície da terra. Não somente estes montes se estendiam para dentro das trincheiras, mas árvores de mais de 150 anos eram freqüentemente encontradas crescendo no fundo das trincheiras. Eu tinha sido capaz de determinar que as trincheiras algumas vezes haviam sido usadas para definir limites de propriedades por causa da facilidade de descrição.
Gado leiteiro somente foi introduzido nessa localidade havia 50 anos. Eu já havia encontrado uma fazenda ou um rancho, em que cavaram trincheiras de seis a oito pés para manter as vacas longe das plantações de petúnias dos vizinhos. Além disso, os dados arqueológicos descobertos nas trincheiras demonstravam que estas depressões foram naturalmente assoreadas antes da introdução de gado leiteiro ou de cana de açúcar na área.
Enquanto os anos progrediram, assim também acontecia com o tamanho da fortificação. Em 1984 Cordell me levou a um complexo de trincheiras na atual cidade de Coban, a umas dez milhas ao sul de La Finca. Quando comecei a explorar essas fortificações, descobri que elas eram contemporâneas àquelas da minha descoberta inicial. Mas em vez de cobrirem várias milhas quadradas, eu descobri que este novo complexo de fortificações em Coban se estendia por mais de nove milhas através de toda a propriedade daquele grande vale.
O rebaixamento do complexo de trincheiras ao sul da propriedade no vale de Coban pode significar só uma coisa: os defensores nefitas não temiam ataque em sua retaguarda ao norte, mas haviam preparado um extenso sistema para se defenderem contra ataques vindos do sul. Tal ataque teria primeiro que ultrapassar as fortificações de La Finca ao sul. O fato que esse sistema defensivo haver sido estabelecido para proteger as planícies ao norte dos ataques vindos do sul é uma confirmação adicional que em Coban e La Finca nós estávamos lidando com o antigo povoado nefita conhecido com Terra de Mânti. De acordo com o modelo1 do Livro de Mórmon que me havia trazido para esta localidade em 1981, a Terra de Néfi, ocupada naquele tempo pelos lamanitas invasores estava ao sul de Mânti, mas Zaraenla, a capital da federação nefita ficava montanha abaixo e ao norte de Mânti. O modelo também estabelece a Terra de Mânti como sendo a primeira trilha entre as antigas capitais rivais de Néfi e Zaraenla.
Mais recentemente, o programa de exploração nesta região identificou um terceiro complexo de fortificações com um sistema de trincheiras similar. Este complexo está situado junto à vila Maia de Santa Cruz Verapaz entre La Finca e Coban. Esta nova descoberta demonstra que antigamente um elaborado sistema existiu ao norte das planícies guatemaltecas; um sistema defensivo que continha a defesa ao fundo. Em outras palavras, existia um sistema reserva para que se a primeira linha de defesa falhasse em La Finca em sua localização altamente estratégica dentro das montanhas ou do "deserto sul2", a segunda linha de defesa poderia envolver as fortificações intermediárias em Santa Cruz Verapaz. Se o exército atacante sobrepujasse as defesas em Santa Cruz, o anel defensivo de nove milhas de perímetro no lado sul de Coban seria a linha final de defesa para a população nefita em Mânti e Coban.
Vaughn Hansen ofereceu a pista que resultou na identificação da presença de antigas paliçadas de madeira lascada nas trincheiras. Vaughn, um engenheiro por formação, me acompanhou em várias expedições em 1983, 1985, 1986 e 1988. Sua associação e conselhos em todos esses anos tem sido incalculáveis. Antes de relatar a contribuição de Vaughn para a descoberta do sistema de paliçada de madeira, eu preciso lançar outros trabalhos de base.
Em 1985 o complexo de trincheiras em La Finca e Coban havia sido parcialmente mapeado e avaliado, mas não tínhamos sido capazes de encontrar qualquer evidência arqueológica que demonstrasse a existência de paliçadas de madeira, conforme descritas no Livro de Mórmon. Essas paliçadas referidas no texto aparentemente consistiam de troncos de madeira cortados e aparados, que antigamente haviam sido levantados na fundação rasa dos canais. Esses canais seriam adjacentes e corriam paralelos a uma grande parede. Certamente que depois de 2000 anos, nenhum resto de madeira, paliçada, paredes ou piquetes poderiam ainda estar no local; há muito eles teriam ruído ao nível do chão. Assim, eu concluí erroneamente que a única evidência arqueológica de restos de madeira teria sido enterrada no fundo do canal. Crendo nisso, eu concluí que não teríamos sido capazes de autenticar a presença de antigas paliçadas, exceto cavando para expor as fundações do canal. Já que eu não estava pronto para estabelecer uma permissão arqueológica junto ao governo da Guatemala para facilitar a escavação, pensei que a descoberta do sistema de paliçadas teria que esperar por mais alguns anos até que eu pudesse tomar essas ações.
Eu estava errado
Enquanto visitava as fortificações de Coban em 1985 com os Hansens, Vaughn pediu para eu ficar em pé dentro de uma das trincheiras para que ele pudesse fotografar a cena. Enquanto estava ali, Vaughn observou uma fileira de pinheiros crescendo ao longo de um dos lagos da trincheira. Estávamos numa floresta de pinheiros, então eu não fiquei surpreso com sua observação de que pinheiros estavam crescendo ao longo das barrancas da trincheira. Eu fiz um comentário a título de piada a respeito de sua grande capacidade de observação. Então eu olhei atrás do meu ombro e vi que grandes árvores estavam crescendo em fileiras ao longo da barranca da trincheira. Conscientizei-me de que florestas naturais não crescem em fileiras, mas numa distribuição aleatória. Eu saí da trincheira para ter uma melhor visão do local. Certo o bastante de que todas as árvores adjacentes àquela trincheira estavam a igual distância da borda leste da trincheira e estavam crescendo numa linha reta ao longo da trincheira, tão longe quanto eu podia ver através da vegetação. Nenhuma das árvores que crescia longe da trincheira estava alinhada; somente aquelas que estavam na barranca ficavam dispostas em fileiras.
Percebendo que talvez estivéssemos prestes a fazer uma importante descoberta, caminhamos ao longo daquela trincheira e examinamos outras trincheiras no local. Em todo lugar que olhamos, encontramos fenômeno idêntico; todas as trincheiras expostas no bosque tinham fileiras de árvores crescendo ao longo de um lado só do parapeito ou barranca da trincheira. Todas as outras árvores estavam espalhadas numa disposição aleatória, o que é esperado numa floresta natural.
Por que árvores cresciam em forma de fileiras ao longo de uma só barranca acima das trincheiras? Começamos a medir as distâncias entre as várias árvores em algumas fileiras. Talvez, há mais de duzentos ou trezentos anos desde que aquelas árvores começaram a crescer alguns dos índios locais as tivessem plantado ao longo dos parapeitos. Pensamos que se as árvores tivessem sido plantadas a distância igual entre as árvores seria tão consistente quanto a definição de fileiras.
Em vez de encontrar uma medida constante entre as filas de árvores, descobrimos que sua distribuição nas fileiras era tão aleatória quanto à distribuição do restante das árvores na floresta.
Então soubemos porque as árvores estavam crescendo em fileiras. Elas não haviam sido plantadas pelos índios ou qualquer outra pessoa. As pinhas distribuídas aleatoriamente que caíam das árvores, haviam tido mais sucesso em criar raiz nas barrancas das trincheiras.
Há só uma possível explicação para seu alto grau de sucesso conforme demonstrado pelas fileiras de árvores maduras: as pinhas caíram numa bem estreita, mas fértil superfície ao longo do topo do parapeito, paralelamente ao comprimento das trincheiras. Estes estreitos e férteis canais são remanescentes da antiga fundação da paliçada, cheios com as bases decompostas das estacas de madeira e paredes dos piquetes que originalmente haviam sido erigidos acima das trincheiras expostas.
Agora, de posse desse novo conhecimento, fomos capazes de lançar a hipótese da presença de antigas paliçadas sem ter que esperar por anos de escavações arqueológicas. Quanto chegar o tempo das escavações, arqueólogos cavarão através do parapeito das trincheiras para confirmar ou refutar esta hipótese. Além disso, observando o lado da trincheira onde as fileiras de árvores marcam a paliçada do canal, prontamente verificamos qual lado da trincheira estava sendo defendida e qual lado estava voltado para o ataque inimigo.
Tendo sido a paliçada e o sistema de trincheiras, não apenas identificado e parcialmente mapeado para análise, fortins elevados também haviam sido descobertos. Estas antigas fortalezas, construídas como terraços complexos e montes são muito diferentes dos centros cerimoniais dos Maias tão freqüentemente identificados durante programas arqueológicos na Mesoamérica. Estes fortins são comparados a um sistema de trincheiras; eles foram construídos em posições estratégicas, voltados para as entradas de La Finca e para o vale de Coban, e controlavam o acesso ao longo da antiga trilha-corredor. Durante as operações nefitas para descobrir Mânti, conforme descrito em Alma capítulo 58, Helamã se refere às “fortalezas” ocupadas pelos lamanitas. As fortalezas mencionadas por Helamã são evidentemente estes fortins elevados que nós identificamos e examinamos.
O forte na entrada de Finca cobre pouco mais que um acre de área. Ele é uma pequena fortaleza, pouco maior que um ponto de controle quando comparamos com a fortaleza de mais de 30 acres de Coban que dá para o cânion do Rio Chio e entra para o vale. A foz do Rio Chio para o vale de Coban, ou para o que sobrou do antigo povoamento de Mânti, não é o principal corredor para o vale, mas o corredor secundário que se não for cuidadosamente controlado por uma guarnição de tropas no forte, pode ser usado por força inimiga para flanquear as elaboradas fortificações na principal entrada do vale e entrar no coração do vale desprotegido.
A principal entrada para o vale de Coban é defendida por um extenso complexo de trincheiras que foram fortalecidas lateralmente por paliçadas de madeira. Assim, uma força inimiga que atacasse os nefitas era forçada a descer para dentro das trincheiras e então tentar abrir caminho nesses diques e depois escalar uma parede vertical formada pelos troncos erigidos. Prosseguindo nesse extenuante processo, os atacantes ficavam realmente expostos aos defensores colocados atrás e sobre as paredes. O sistema de trincheiras realmente apresentava uma defesa formidável.
Mas a principal entrada para o vale de Coban contém uma estrutura defensiva que reforça esse enorme sistema fortificado. Essa estrutura é mencionada em outra parte do registro por Mórmon como uma “passagem” ou um “lugar de entrada”. No capítulo 49 de seu livro, discutindo as defesas de Amonía e Noé, Alma provê uma descrição definitiva do sistema de trincheiras e paliçadas usado durante esta guerra. Ele também descreve o “lugar de entrada” em Noé, onde os nefitas infligiram uma terrível perda às tropas atacantes dos lamanitas 3.
Infelizmente o Livro de Mórmon não dá detalhes da natureza do sistema defensivo de Mânti, senão comentários gerais concernentes a fortalezas ou lugares de retiradas. Imagine meu espanto em 1984 quando Cordell me levou para uma complexa trincheira na entrada do vale de Coban, que tinha uma estreita passagem igual àquela construída em Noé, conforme descrita acima.
A estreita passagem em Coban era o antigo “lugar de entrada” para o vale. Ele se estende por quase meia milha desde o pé do monte, acima do vale e desce para o coração do vale de Coban. Apesar de que as extremidades deste corredor linear ter sido destruído durante o desenvolvimento histórico e moderno, a maior parte da estreita passagem ainda está intacta e prontamente identificável ao atravessar a pastagem aberta na encosta ao norte e ao centro do vale. Essa estrutura é relativamente estreita, abarcando menos de 50 pés de largura. O centro da passagem contém um corredor que evidentemente foi mantido aberto para permitir a passagem de pessoas que viajavam para dentro e para fora do vale. Flanqueando o corredor há duas trincheiras; depois de 2.000 anos, essas trincheiras de cinco a oito pés de profundidade ainda existem. Paliçadas de madeira flanqueavam a periferia externa das duas trincheiras, cercando completamente qualquer pessoa que se movimentasse pelo corredor.
Uma força atacante pode se movimentar na estreita passagem, mas não pode se apresentar de frente larga o suficiente dentro deste corredor. Como resultado disso uma força defensora menor pode bloquear o corredor e parar os atacantes. Forças de defesa estacionadas atrás e sobre a paliçada podem mirar com suas flechas, lanças e pedras nos atacantes presos, na formação de uma estreita coluna dentro do corredor. Nessa difícil situação, as forças atacantes não podem se dirigir em velocidade contra os defensores sobre as paredes de troncos de madeira sem primeiro descer para dentro das trincheiras e então, completamente expostos aos seus inimigos, escalar as paliçadas.
Assim aconteceu na passagem de Noé, onde os lamanitas foram capazes de causar severos ferimentos nas pernas de quase cinqüenta nefitas, mas, por sua vez, sofreram a perda de todos os seus capitães-chefes "e mais de mil lamanitas foram mortos" (Alma 49:23-24).
O que evitava que as forças lamanitas flanqueassem a estreita passagem e atacassem pela retaguarda? O labirinto de trincheiras associado a um anel de paliçadas que rodeavam 9,5 milhas de largura na periferia sul do vale de Coban. Esta rede de trincheiras forçava as tropas atacantes na direção da estreita passagem ou dirigia-os para outros tipos de posições controladas, onde eles ficavam vulneráveis frente aos nefitas. Verdadeiramente o vale de Coban contém uma formidável fortificação. O fato de que depois de 2.000 anos de ocupação no vale de Coban, esta fortificação estar ainda intacta na sua maior parte, é virtualmente um milagre.
Outro importante e impressionante incidente ocorreu em 1985 com a chegada de Gary Elliott na Guatemala. Esta experiência serve para relembrar que eu não sou o único responsável por este processo de descobertas arqueológicas.
Ao retornar para a Guatemala in 1985 para começar aquela temporada de exploração nos altiplanos do norte, fui apresentado ao recém apoiado presidente de missão e sua esposa, Gary e Sharon Elliott. O Presidente e a Sister Elliott só estavam no país por talvez seis meses. Para meu espanto e alegria, eles haviam sido entrevistados para sua designação na presidência da Missão pelo Elder McConkie, enquanto Gary, um Coronel da Marinha, lecionava táticas militares e estratégia no Comando do Exército e no General Staff College no Fort Leavenworth, Kansas.
Eu fiquei exultante com sua chegada na Guatemala, pois minha limitada experiência não era suficiente para facilitar a análise de alguns sistemas de trincheiras.
A forma e o uso de algumas trincheiras eram aparentes para mim. Eu podia facilmente entender os profundos diques que se estendiam ao redor dos contornos nos montes servindo como proteção às forças que defendiam o local. Aquelas trincheiras fortalecidas com suas paliçadas de troncos de madeira erigidos morro acima ao lado dos diques tinham que ser escalados antes que as forças agressoras pudessem assegurar posições e controlar o topo dos montes fortificados. Este era um tipo defensivo de trincheira facilmente identificável para mim.
Outro tipo de trincheira havia sido mapeado e identificado, entretanto eu não fazia idéia de seu “layout”. Este segundo tipo de trincheira era estreito, correndo acima e abaixo da encosta, ligando-se várias vezes a outras trincheiras similares. Várias delas haviam sido mapeadas em La Finca, as quais se estendiam por quase um quilometro. Algumas vezes esse segundo tipo se estendia diretamente para o declive na retaguarda de uma posição defensiva, passava através de uma trincheira de defesa e então continuava encosta acima para o centro do recinto defensivo onde as tropas seriam guarnecidas.
Este tipo de trincheira fazia pouco sentido para mim
Assim que conheci o Presidente Elliott e soube de sua experiência militar, eu o convenci a desistir de um de seus valiosos dias de preparação para me acompanhar até La Finca e Coban. Eu precisava de sua opinião a respeito de todas essas espantosas estruturas existentes naquela região.
Nós tivemos um dia maravilhoso juntos, vagando através dos verdes montes e Alta Verapaz. O President Elliott lentamente foi ficando cada vez mais envolvido por essas antigas estruturas. Enquanto o dia estava terminando e nós nos preparávamos para voltar para a Cidade da Guatemala, o Presidente Elliott relatou o propósito das trincheiras desconhecidas e a maneira pela qual todo o sistema defensivo funcionava. As longas e estreitas trincheiras haviam sido usadas para rápido e seguro transporte entre os vários locais, dentro do sistema defensivo. Ele explicou como, através do uso dessas trincheiras, uma força de defesa menor do que a usualmente necessária, podia defender uma grande área. Os defensores podiam rapidamente dispor-se em formação de combate saindo de posição de seus seguros bivaques (ou abrigos) descendo pela comunicação ou trincheiras de entrada e, através do sistema defensivo, se deslocar para qualquer ponto que pudesse estar sendo atacado. Usado como um sistema, as trincheiras defensivas ou linhas de comunicação e suprimento facilitavam a defesa de toda a estrutura. Estes diversos sistemas de trincheiras melhoravam o complexo de fortificação canalizando uma força de ataque para posições expostas, onde eles podiam ser sistematicamente reduzidos em pedaços pelas forças defensoras.
O Presidente Elliott fez algumas observações adicionais. Ele declarou que os comandantes que planejaram aquele sistema de fortificações em La Finca e ao redor de Coban tinham um entendimento dos conceitos de defesa móvel melhor do que atualmente está sendo utilizado pelas forças militares modernas. Ele admirou-se de que as forças americanas que ele havia observado e comandado durante suas quatro viagens ao Vietnam podiam ter usado da intensa motivação e dedicação que estão refletidos no esforço despendido para construir aquelas antigas fortificações.
Finalmente ele me disse com seu típico largo sorriso, e olhos provocadores: "Sabe, Ric, quando te ouvi pela primeira vez , acreditei em você – mas eu realmente não acreditava em você. Agora acredito!”
Eu tenho conseguido voltar a cada um dos 13 últimos anos aos locais fortificados de La Finca e Coban onde esse processo de descobertas começou em 1981. A cada retorno, novos dados têm sido conseguidos a respeito desse local e da região ao seu redor.
Nós já escavamos trincheiras, passagens estreitas e complexos fortificados. As escavações providenciarão excepcionais informações sobre o povo que preparou, construiu e defendeu os complexos fortificados. Nós seremos capazes de datar os povoamentos usando a tecnologia do radio-carbono, examinar a arquitetura das estruturas de defesa e das casas que queimaram e caíram dentro das trincheiras. Seremos capazes de estudar seus alimentos, ferramentas, armas, itens domésticos e facilidades de abastecimento e estocagem. Os corpos humanos que caíram ou foram atirados nas trincheiras ainda estão preservados dentro delas, no carvão e húmus enterrados nas antigas depressões das trincheiras. Estes restos podem ser cuidadosamente retirados para a avaliação de antropólogos.
Todos os meus 13 anos de exames arqueológicos nessa região estão baseados na aceitação de que estes indivíduos eram guerreiros nefitas e lamanitas que morreram há 2.000 anos durante a guerra do capitão-chefe Morôni. Se essa suposição for correta, estes restos humanos poderão fornecer informações de características físicas, estatura, peso, idade, sexo, dieta, e causas da morte destas antigas populações.
O Livro de Mórmon fornece quase 1.000 anos de história nefita, mas absolutamente nenhuma pista de como estas pessoas eram, o que elas comiam, quais doenças experimentaram, quão bem se saíam suas mulheres durante o parto, ou as razões de suas mortes, afora as batalhas.
Enquanto lemos O Livro de Mórmon, tendemos em imaginar os nefitas e lamanitas como duas populações separadas por causa das aparentes diferenças genéticas relacionadas à sua aparência física. Através da arqueologia podemos determinar e definir quais realmente eram essas diferenças. Através do moderno milagre da decodificação do DNA, agora podemos estudar quão fielmente as populações nefitas podem se parecer com os antigos povos Semitas de sua terra natal no Oriente Médio4.
As hipóteses desenvolvidas através das correlações dos locais da Mesoamérica com as fortificações descritas no Livro de Mórmon podem ser testadas, expandidas e re-trabalhadas. Temos muito a aprender a respeito dos antigos povos que ocuparam estes lugares. A Arqueologia é a ferramenta para a redescoberta de antigas culturas, inclusive culturas do Livro de Mórmon. A arqueologia oferece-nos o processo para o entendimento dos lugares únicos desses povos no tempo e no espaço da existência do homem.
Referências:
1 veja o artido de Março de 1994 This People or Deciphering the Geography of the Book of Mormon, publicado em 1988 pela Deseret Book Company.
2 Esta cadeia de montanhas também foi referida por Mórmon como a “estreita faixa de deserto".
3 Veja os versículos 21 a 25 em Alma 49. As capacidades defensivas da passagem estreita também é discutida no artigo de Hauck, publicado na edição de Março de This People.
4 Minha avaliação pessoal dos lamanitas é que seus restos serão mais parecidos aos antigos índios Maias, com os quais, eu suspeito, tiveram relacionamentos intermaritais. Os nefitas, por outro lado, parecem ter conservado sua própria população restringindo casamentos fora de sua comunidade relativamente fechada. Como resultado desse processo, eu penso que as populações nefita e lamanita anteriores ao ano 34 d.C. sejam distintamente diferentes, mas por volta do ano 200 d.C. essas diferenças eram menos aparentes por causa do longo período de interação pacífica entre essas duas populações. Se esta teoria for correta, a população geral tenderá mais para as características físicas dos Maias depois do ano 300 d.C., com a tradicional característica da população nefita diminuindo bem rapidamente no quinto Século depois de Cristo.
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